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segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Vida de um português em Agosto 2008

8h30 – José Silva acorda e constata que a sua casa foi assaltada durante a noite. Espreguiça-se. Toma banho tentando poupar a água, toma o pequeno-almoço tentando poupar o leite e põe-se a caminho do emprego tentando poupar os sapatos.
9h00 – Empurra o carro até à bomba de gasolina e é assaltado duas vezes: a primeira pela gasolineira, que voltou a aumentar os preços do combustível; a segunda por criminosos armados, que lhe levam o pouco que ainda restava na carteira. Boceja. Conclui que prefere os segundos assaltantes, na medida em que roubam menos e com menor frequência. Nota que, apesar disso, a polícia não faz qualquer esforço para apanhar os primeiros.
10h00 – Já na estrada, é vítima de carjacking. Encolhe os ombros. Prossegue a pé.
10h05 – Um gang tenta assaltá-lo. Explica que ficou sem a carteira num assalto anterior.
10h10 – Outro gang tenta assaltá-lo. Fornece a mesma explicação. Os membros do gang colam-lhe um autocolante na lapela para que futuros meliantes saibam que já foi assaltado nesse dia e evitem perder tempo com ele. Recomendam-lhe que retire o autocolante assim que voltar a transportar valores.
11h30 – Vai ao banco levantar dinheiro.
11h32 – Criminosos armados irrompem no banco. Clientes e funcionários formam calmamente uma fila e tiram senhas para serem assaltados por ordem.
11h35 – O criminalista Moita Flores irrompe no banco e começa a comentar o assalto junto de um grupo de clientes. Tece várias considerações sobre um novo tipo de criminalidade violenta que parece estar a aumentar no nosso país, aponta as limitações da polícia e sublinha as incongruências do novo código de processo penal. Alguns clientes oferecem-se para serem sequestrados, caso os assaltantes lhes garantam que os levam para longe do criminalista Moita Flores.
11h45 – O criminalista Moita Flores interpela os assaltantes e comunica-lhes que o método que escolheram para levar a cabo o assalto não é o melhor, criticando sobretudo a não utilização de luvas e tecendo alguns reparos ao plano de fuga, que considera extremamente frágil.
11h46 – Um dos assaltantes dispara duas vezes sobre a perna do criminalista Moita Flores.
11h47 – Clientes e funcionários do banco homenageiam os assaltantes com um forte aplauso.
17h30 – Depois de várias horas de sequestro, o assalto termina. A polícia detém os criminosos, resgata os reféns e amordaça o criminalista Moita Flores, para que vá receber assistência hospitalar.
18h00 – Por sorte, mal acaba de sair do banco, José Silva encontra o seu carro abandonado na berma da estrada. Entra no veículo e dirige-se para casa.
18h05 – É detido pela polícia por se encontrar a conduzir um carro que foi usado em diversos crimes.
20h00 – É identificado e preso. Na cela, verifica que o relato da sua vida é extraordinariamente demagógico e conclui que toda a sua existência podia ter sido inventada por Paulo Portas. Chora.

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